O Estado de S.Paulo - 29 de março de 2011
O governo venceu, depois de quase dois anos e meio de campanha contra o presidente da Vale, maior empresa privada do Brasil, segunda maior mineradora do mundo e líder mundial na extração de minério de ferro.
Roger Agnelli deixará o posto, afinal, porque o Bradesco desistiu de enfrentar a pressão do Palácio do Planalto.
Sem a rendição do banco, o governo federal não teria os votos necessários para forçar a mudança na cúpula da empresa.
O acordo foi concluído em reunião do ministro da Fazenda, Guido Mantega, com o presidente do conselho de administração do Bradesco, Lázaro Brandão, na sexta-feira.
O resultado já era dado como certo por fontes do governo e, portanto, não surpreendeu.
Mas a disputa em torno da presidência da mineradora foi muito mais que um embate entre dois grandes acionistas.
Este é o ponto mais importante, não só para os diretamente envolvidos nesse confronto, mas, principalmente, para o País.
Se houve algo surpreendente, não foi a rendição do Bradesco, na semana passada, mas sua longa resistência.
Há uma enorme desproporção de forças entre o governo federal e uma instituição financeira privada, mesmo grande.
Os dirigentes do banco acabaram levando em conta seus interesses empresariais e os possíveis custos de um longo confronto com as autoridades.
A pressão exercida a partir do Palácio do Planalto foi "massacrante", segundo uma fonte do banco citada pelo jornal O Globo.
Ao insistir no afastamento de Roger Agnelli, a presidente Dilma Rousseff seguiu no caminho aberto por seu antecessor.
Derrubar o presidente da Vale foi um dos grandes objetivos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Desde o agravamento da crise internacional, em 2008, quando a Vale anunciou a demissão de cerca de 1.300 funcionários, as pressões contra os dirigentes da empresa foram abertas.
Além de se opor às dispensas, o presidente da República passou a exigir da Vale maiores investimentos em siderurgia.
Seria preciso, segundo ele, dar menos ênfase à exportação de minério e realizar um maior esforço de venda de produtos processados.
Em sua simplicidade, o presidente Lula nem sequer levou em conta a enorme capacidade excedente da indústria siderúrgica, não só no Brasil, mas em escala mundial.
Mas nem é o caso de examinar o mérito das ações defendidas pelo presidente da República e por seus estrategistas.
Se essa discussão valesse a pena, os argumentos teriam ocupado espaço na imprensa e os principais dirigentes da Vale com certeza os teriam examinado, com a mesma competência demonstrada ao promover o crescimento da empresa desde sua privatização.
O ponto importante é outro.
O presidente Lula agiu como se fosse atribuição de seu gabinete administrar tanto as estatais quanto as grandes companhias privadas.
Deu ordens a diretores da Petrobrás e censurou-os publicamente.
A imprudente associação da Petrobrás com a PDVSA para construir a refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, é fruto do cumprimento de uma dessas ordens.
Aliás, nem sempre os dirigentes da estatal conseguiram seguir as determinações de Lula - a preferência a fornecedores nacionais, por exemplo - porque isso comprometeria seu trabalho.
Um presidente sensato não se meteria sequer na administração de uma estatal grande e complexa.
Muito menos se atreveria a ditar políticas para empresas privadas também grandes, complexas e bem-sucedidas como a Vale e a Embraer, mas a autocrítica e o sentido de proporção nunca foram grandes atributos do presidente Lula.
Além do mais, sentimentos como esses acabariam facilmente sufocados pelo objetivo maior: comandar, de seu gabinete, várias das maiores empresas brasileiras.
Se bancos federais se meteram onde não deveriam, comprando, por exemplo, participação no Banco Panamericano, foi para atender a essa concepção de poder.
A presidente Dilma Rousseff já mostrou, em mais de uma ocasião, diferenças importantes em relação a seu antecessor e grande eleitor.
Neste caso, no entanto, quando se trata da fome de poder e da ambição centralizadora, a continuidade da política anterior parece garantida.
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